A etnografia No Curso da Lama tenta retratar vidas suspensas e o desastre em curso

Por Lília Gomes

Importante destacar que os artigos trazem para essa publicação história não apenas os nomes de seus autores, mas também das instituições que representam, no meu caso, o Ministério Público do Trabalho. Instituição que tem atuação fundamental no enfrentamento desses desastres, aqui hoje representada pela nossa procuradora-chefe Adriana Souza.

Em breve síntese, posso dizer que em uma situação normal, vamos a campo fazer uma etnográfica para construir uma narrativa da cultura de um povo, de um tempo, em um espaço físico e social.

No caso do rompimento da barragem da Samarco, em Mariana, lamentavelmente, nossa tentativa foi de retratar a morte. A morte em suas mais diversificadas possibilidades: de espaços físicos, de histórias, de culturas, de incontáveis espécies vivas. A morte do homem e o apagamento de subjetividades.

Se recordarmos que constituímos nossa identidade a partir dos relacionamentos com os outros e com o espaço onde vivemos, em um contínuo processo de alteridade, vamos concluir que, por meio do rompimento da barragem em Mariana e agora também em Brumadinho, a Samarco e a Vale, proporcionaram à inúmeras comunidades, o apagamento de identidades coletivas e individuais. Aqueles que não morreram foram conduzidos a um estado, indescritível, de vida suspensa, por um tempo que não se sabe qual, sequer sabemos se terá fim.

Daí podermos falar, ao meu ver, de modo apropriado, em um desastre em curso, porque não sabemos nem a extensão total de suas dimensões, nem em qual espaço temporal ele estará operando, tampouco até quando suas consequências estarão ativas

Sendo assim, No Curso da Lama é uma tentativa de construir uma narrativa de vidas suspensas: vida ambiental, animal, humana, social. Múltiplos olhares estão reunidos no conjunto de cerca de 20 fotografias, porém sem a pretensão de esgotar as implicações do desastre, já que a sua dimensão plena é inalcançável, por qualquer linguagem: oral, textual ou imagética.

Registro e agradeço a parceria dos nove fotógrafos que cederam imagens para compor o trabalho, sendo o principal deles, o presidente do Instituto Últimos Refúgios, Leonardo Merçon, que coloca seu trabalho fotográfico, de riquíssimo teor, a serviço da promoção da preservação ambiental, no Brasil.

O livro Mar de Lama da Samarco na Bacia do Rio Doce: em busca de respostas está disponível na Biblioteca da Sede e para download gratuito.

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Versão digital do livro "Mar de Lama" já está disponível

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