Sentença garante efetivo combate ao trabalho infantil na cidade de Sete Lagoas (MG)

Município apresentava altos índices de trabalho infantil e se mostrava inerte na elaboração e implementação de políticas públicas sobre o tema

Belo Horizonte (MG) – O Município de Sete Lagoas (MG) foi condenado em Ação Civil Pública (ACP), com pedido de antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional, de autoria do Ministério Público do Trabalho em Minas Gerais (MPT-MG), ao cumprimento de políticas públicas para o efetivo combate ao trabalho infantil e ao pagamento de indenização por danos morais coletivos, no valor de R$250.000,00 mil reais.

Segundo a procuradora do Trabalho que atuou no caso, Luciana Coutinho, “o Diagnóstico Intersetorial Municipal, elaborado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário, revelou dados preocupantes na cidade, destacando-se, dentre outros os números relativos ao trabalho infantil, taxa de evasão escolar, crianças e adolescentes ocupados em trabalho doméstico. Os dados sobre o município extraídos do Observatório da Prevenção e da Erradicação do Trabalho Infantil indicam preocupante envolvimento de crianças e adolescentes extremamente jovens com o trabalho. Os dados da Prova Brasil, promovida pelo INEP/MEC em 2017 apontam número expressivo de alunos do 5º e 9º ano em situação de trabalho”.

De acordo com a procuradora, “o município aderiu ao cofinanciamento federal para execução das ações estratégicas do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI), constituindo fator adicional a demonstrar a necessidade de políticas públicas consistentes para enfrentamento ao trabalho infantil, já que o aceite de tais recursos significa compromisso e confissão acerca da existência do problema a ser combatido. Os dados do Tribunal de Contas do Estado revelam que não houve previsão orçamentária no município em 2016/2017 para investimento do combate ao trabalho infantil. Além da prova documental, foram realizadas várias diligências in loco, capacitação da rede e ouvidos representantes de equipamentos socioassistenciais do Município, além de profissionais vinculados a outros órgãos de proteção, como Conselheiros Tutelares. Ainda segundo Luciana, “ O Município a despeito do que atestado na investigação, não concordou com o ajustamento de conduta. Assim, alegando a inércia do município e de seu gestor, a inexistência de políticas públicas eficazes à prevenção e erradicação do trabalho infantil, solicitamos a condenação do município ao cumprimento das obrigações elencadas na ACP, além de indenização por danos morais coletivos”.

Diante dos fatos e em face da relevância do tema, a juíza da Vara do Trabalho de Sete Lagoas, Rosângela Alves da Silva Paiva, deferiu, em sentença, a condenação do Município de Sete Lagoas para cumprir as obrigações elencadas. Segundo a juíza, o deferimento foi concedido porque “restou comprovado que a implementação de medidas voltadas à erradicação do trabalho infantil no município se encontra em estágio embrionário, não havendo sequer a conclusão do diagnóstico que poderá nortear a concretização de políticas públicas capazes de suprimir o abominado trabalho infantil nesta municipalidade”.

Além do pagamento da indenização por danos morais coletivos, no valor de R$250.000,00 mil reais, o município foi condenado a formular políticas públicas e tomar diversas providências para combater o trabalho infantil na cidade. Dentre essas providencias, destacam-se: garantir, no próximo Orçamento Municipal, e nos que lhe sucederem, verbas suficientes para implementação do(s) programa(s) municipal(s) de erradicação do trabalho infantil e regularização do trabalho do adolescente no Município; elaborar, no prazo de 90 dias, diagnóstico do trabalho infantil no Município e estabelecer uma agenda intersetorial de erradicação do trabalho infantil; promover, inicialmente, no prazo de 90 dias, e, após, periodicamente, pelo menos uma vez por ano, a capacitação de todos os profissionais dos órgãos e entidades do Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente (SGDCA); promover, periodicamente, pelo menos três vezes por ano, campanhas de conscientização da população em geral em escolas, feiras, mercados públicos e comércio em geral. Além disso, o Município deverá, também, proceder, imediata e constantemente, ao resgate/cadastro das crianças e adolescentes encontrados em situação de trabalho, e de suas famílias, para efeito de inclusão em programas sociais do município e cadastramento no Cadastro Único do Governo Federal.

Em caso de descumprimento das obrigações estabelecidas, o Município estará sujeito ao pagamento de multa no valor de R$2.000,00 mil reais, por obrigação descumprida, a cada mês em que a omissão for mantida, renovável a cada nova constatação, reversível a projetos, órgãos públicos ou entidades beneficentes dedicadas às crianças e aos adolescentes da região abrangida pela circunscrição da Segunda Vara do Trabalho de Sete Lagoas.

Saiba mais:

Os indicadores do Diagnóstico Intersetorial Municipal elaborado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário, com base em informações de vários cadastros públicos como o Censo 2010 – IBGE e outros, demonstram:

a) 1.391 casos de trabalho infantil entre 10 e 15 anos (6,5% da população nessa faixa etária), sendo 476 entre 10 e 13 anos (3,4% de taxa de ocupação nessa faixa etária) e 915 entre 14 e 15 anos (12,5% de taxa de ocupação nessa faixa etária);

b) 5.023 crianças e adolescentes até 17 anos que não frequentam a escola (alta taxa de evasão escolar);

c) 363 crianças e adolescentes de 10 a 17 anos ocupados no trabalho doméstico (11,1% da população total ocupada nessa faixa etária);

d) apenas 74 adolescentes de um total de 915 entre 14 e 15 anos ocupados como aprendizes;

e) apenas 254 adolescentes de um total de 1876 entre 16 e 17 anos ocupados como aprendizes;

f) apenas 2 famílias com marcação de trabalho infantil recebem bolsa família e/ou frequentam o serviço de convívio e fortalecimento de vínculos.

ACPCiv 0010752-67.2021.5.03.0040

 

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